Vivemos na época da ditadura da perfeição, em que todos queremos ser perfeitos, ter vidas perfeitas, empregos perfeitos, filhos perfeitos e tudo o mais que for possível que seja perfeito. Mas o que é afinal o perfecionismo?
Ao longo do tempo, tem-se compreendido que o perfecionismo é muito mais do que a vontade de fazer as coisas bem, de atingir a perfeição ou a excelência. Compreendeu-se que o perfecionismo é um traço de personalidade que está relacionado com aspetos intrapessoais (na relação que cada um estabelece consigo próprio), mas também com questões interpessoais (isto é, na relação com os outros).
Assim, envolve várias dimensões, nomeadamente: padrões pessoais (a pessoa estabelece padrões excessivamente altos para si próprio, fazendo depender a sua autoavaliação da realização desses padrões), preocupação com os erros(sendo estes vistos como indicativos de falha e geradores de reações emocionais negativas), dúvidas sobre as capacidades ou competências para realizar e completar tarefas e uma grande necessidade de organização. O perfecionismo pode estar associado à perceção de exigências parentais, nomeadamente que os pais têm expetativas elevadas em relação a si – expetativas parentais, ou de que os pais são demasiado críticos – críticas parentais. Quando os comportamentos e pensamentos perfecionistas derivam e são dirigidos ao próprio, estamos perante Perfecionismo Auto-Orientado, isto significa que o indivíduo cria as suas próprias expetativas e exige a perfeição para si próprio. Contudo, por vezes, os indivíduos perfecionistas consideram que são as pessoas significativas que impõem exigências demasiado altas, que o avaliam de uma forma exigente e que esperam que seja perfeito, aí estamos perante Perfecionismo Socialmente Prescrito. Por fim, as normas irrealistas e perfecionistas podem ser dirigidas a terceiros, estamos aí perante Perfecionismo Orientado para os Outros.
Então o perfecionismo é útil ou pode ser prejudicial à nossa saúde mental?
De uma forma geral, o problema não é ser ou não ser perfecionista, mas sim a forma e a função desse perfecionismo e como ele tem impacto na vida de cada pessoa. Por norma, é o medo excessivo de falhar e uma forma de autoavaliação disfuncional (muito focada nos erros e nas falhas) que distinguem o perfecionismo adaptativo do perfecionismo mal adaptativo ou problemático. Não há qualquer problema em ter padrões elevados, mas que se demonstrem razoáveis e realistas, que promovam a autoestima e um sentido de autoeficácia, acompanhado de uma baixa preocupação com a rejeição (quando esses padrões não são atingidos). Pelo contrário, as dificuldades surgem quando os padrões são excessivamente altos, irrealistas, extremamente difíceis de atingir, a pessoa perceciona que só será aceite se tiver um desempenho perfeito e critica-se duramente por ter falhado. Deste modo, a motivação primária é evitar falhar, prevenir a crítica dos outros e a sua própria autocrítica, existindo constantemente dúvidas relativamente ao desempenho pessoal associadas, geralmente, a uma baixa autoestima.
Portanto, apesar de se considerar que os padrões elevados do perfecionismo podem estar associados ao sucesso, se o principal agente de motivação for o medo de falhar e de evitar críticas (típicos do perfecionismo mal adaptativo) mais do que o desejo genuíno de melhorar, o resultado pode ser o sofrimento psicológico.
Autores
Marina Oliveira
Psicóloga Clínica e da Saúde Mestre em Psicologia Clínica: Intervenções Cognitivo-Comportamentais, pela Universidade de Coimbra. Formação especializada em reabilitação psicossocial em saúde mental Experiência em prática clínica em contexto institucional, com base no modelo de reabilitação psicossocial, experiência na Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados em Saúde Mental