Quando até pensar cansa: A Fadiga Depressiva
A depressão é muito mais do que tristeza passageira: trata se de uma perturbação do humor persistente, que pode durar semanas ou meses e comprometer gravemente a capacidade de uma pessoa para viver o seu dia a dia. Ao contrário da tristeza, que normalmente se relaciona com um acontecimento específico e tende a desaparecer, a depressão manifesta se através de humor deprimido quase todos os dias, perda de interesse ou prazer em atividades antes apreciadas, alterações no sono e no apetite, fadiga intensa, dificuldade de concentração, sentimentos de culpa ou inutilidade e, em casos mais graves, ideação suicida.
Um dos sintomas mais debilitantes da depressão é a fadiga persistente. Ao contrário do cansaço comum, que geralmente melhora com o descanso, a fadiga associada à depressão não alivia com o sono ou repouso. Paradoxalmente, as pessoas sentem-se ainda mais exaustas após períodos de inatividade.
A fadiga depressiva, presente em muitos casos de depressão, vai muito além de um simples cansaço físico ou mental: é uma exaustão profunda que torna mesmo as tarefas mais simples num enorme esforço. Neurotransmissores como a serotonina, a noradrenalina e a dopamina, que regulam o estado de alerta e o sistema de recompensa, encontram se desequilibrados, reduzindo drasticamente a energia disponível. Ao mesmo tempo, os padrões de sono são frequentemente perturbados – seja pela dificuldade em adormecer, pelos múltiplos despertares noturnos ou pelo sono não reparador – o que agrava ainda mais a sensação de cansaço contínuo. Para além disso, é frequente a perda de interesse e prazer nas atividades diárias. Tarefas simples tornam-se física e emocionalmente desgastantes, exigindo um esforço desproporcional para serem realizadas. Assim, cada tarefa ou decisão exige muito mais energia, criando um ciclo vicioso: quanto mais cansada a pessoa se sente, menos consegue fazer, e quanto menos faz, mais profunda se torna a sensação de inutilidade e a própria depressão.
As causas da depressão e da sua componente de fadiga são múltiplas e interligadas: desde predisposição genética a eventos de vida stressantes (como luto, doenças crónicas, desemprego ou trauma), assim como características de personalidade, padrões de sono irregulares e estilos de vida pouco saudáveis.
O tratamento eficaz combina várias abordagens: farmacológica (os medicamentos antidepressivos atuam ao nível neuroquímico), psicológica (a psicoterapia permite ajustar padrões de pensamento pouco úteis e desenvolver estratégias para lidar com as adversidades) e ativação comportamental. Esta intervenção psicológica baseia-se na premissa de que a depressão está associada a uma redução das atividades prazerosas e gratificantes. Assim, o objetivo é ajudar a pessoa a identificar e retomar atividades que lhe proporcionem prazer e sentido, mesmo que inicialmente não sinta vontade de as realizar.
A ativação comportamental deve ter em conta cuidados com a higiene do sono, a prática de exercício físico, mas também o envolvimento em atividades sociais, culturais ou de lazer que estejam alinhadas com os valores e interesses da pessoa. O importante é que estas atividades sejam significativas e proporcionem uma sensação de realização e bem-estar.
É fundamental compreender que, embora a fadiga depressiva seja um sintoma real e debilitante, a inatividade prolongada tende a agravá-la. Por isso, é essencial encorajar a pessoa a dar pequenos passos para retomar atividades prazerosas, mesmo que inicialmente pareçam difíceis. Com o tempo, estas ações podem contribuir para a melhoria do humor, do sono e da energia, promovendo a recuperação e o bem-estar geral. O apoio familiar e social é igualmente fundamental, tanto para diminuir o isolamento como para incentivar a adesão ao plano terapêutico.
A depressão e a fadiga depressiva não devem ser ignoradas ou desvalorizadas. Quanto mais cedo forem identificadas, melhores são as possibilidades de recuperação.
Se ao ler este texto se identificou com alguns dos sintomas descritos, ou se conhece alguém que possa estar a viver com este tipo de cansaço persistente, tristeza profunda ou perda de interesse pela vida, é fundamental não ignorar esses sinais. Procurar ajuda profissional não é sinal de fraqueza, mas sim um passo corajoso e necessário rumo ao bem-estar. Cuidar da saúde mental é tão importante quanto cuidar do corpo — permita-se a esse cuidado.
Autores
Marina Oliveira
Psicóloga Clínica e da Saúde Mestre em Psicologia Clínica: Intervenções Cognitivo-Comportamentais, pela Universidade de Coimbra. Formação especializada em reabilitação psicossocial em saúde mental Experiência em prática clínica em contexto institucional, com base no modelo de reabilitação psicossocial, experiência na Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados em Saúde Mental
 
                        