Queremos viver a nossa vida sem som?
Queremos viver a nossa vida sem som?
Já lhe aconteceu ver parte de um filme, série ou programa de televisão sem som? Possivelmente já, devido a uma falha técnica, mas decerto tentou resolver a situação. Durante esse período, provavelmente conseguiu compreender o que estava a acontecer e as imagens até podiam ser ótimas, mas certamente não era muito satisfatório…
Se queremos usufruir de toda a experiência quando vemos um programa, um filme ou uma série, porque é que queremos diminuir a sonoridade da nossa vida? Porque é que não queremos sentir as emoções que enquanto humanos é normal sentirmos?
A propósito do Dia Mundial da Saúde Mental, que pretende promover um maior conhecimento sobre o tema, gostaria de o convidar a refletir sobre as suas emoções. Já ponderou: porque é que temos emoções? Elas servem para quê? Permita-me questionar: Conhece realmente as suas emoções? Onde é que elas habitam no seu corpo? Consegue compreender onde vive a sua alegria, a tristeza, a raiva, o medo, a ansiedade?
O sofrimento é inerente à condição humana e podemos experienciá-lo de múltiplas formas. Comummente queremos fugir da ansiedade, do medo e de tantas outras emoções ou experiências que consideramos desagradáveis. Contudo, as emoções (agradáveis ou desagradáveis) informam-nos sobre o que está a acontecer ao nosso redor e têm uma função. Pensemos na ansiedade, uma «queixa» cada vez mais comum na sociedade em que vivemos. A ansiedade é uma emoção que tem como função proteger-nos e garantir a nossa sobrevivência. Se não tivesse ansiedade, não teria nada que o alertasse para o perigo de atravessar a estrada sem olhar para ambos os lados!
Se nos desconectamos das emoções que consideramos desagradáveis, também nos desconectamos das emoções mais agradáveis de sentir. Assim, a capacidade de notarmos e nomearmos as nossas emoções é algo fundamental para desenvolvermos a nossa inteligência emocional.
Para além disso, quanto menos consciência temos daquilo que estamos a sentir, menos controlo temos sobre o nosso comportamento. Aceder às nossas emoções, permite-nos compreender quais são as situações e contextos que nos podem ser úteis ou prejudiciais e assim tomar decisões mais sábias e escolhermos os nossos comportamentos de uma forma mais útil para vivermos uma vida com significado.
Conhecer as nossas emoções também nos permite conhecer e identificar as emoções do outro, algo essencial para construir e cultivar relações fortes e saudáveis. Quando interagimos com os outros desligados das nossas emoções, é como se estivéssemos a ver o filme ou a série sem som. Tal pode gerar conflitos, tensão e dificuldades na relação, pois não acedemos à informação completa na interação, o que pode causar falhas na compreensão das suas intenções e dos seus sentimentos, não nos permitindo ter ações congruentes com o que o outro nos está a comunicar.
Não há saúde sem saúde mental! Desta forma, para cuidar da sua permita-se a ser paciente e corajoso, a conhecer e a dar-se conta das suas emoções. Tal como o verão e o inverno não duram o ano inteiro, também as emoções são transitórias e têm o seu tempo. Dê-lhes o tempo e o espaço que elas necessitam para comunicar consigo.
Autores
Marina Oliveira
Psicóloga Clínica e da Saúde Mestre em Psicologia Clínica: Intervenções Cognitivo-Comportamentais, pela Universidade de Coimbra. Formação especializada em reabilitação psicossocial em saúde mental Experiência em prática clínica em contexto institucional, com base no modelo de reabilitação psicossocial, experiência na Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados em Saúde Mental